“Venha, acabe comigo. Eu estou farto de você. Você está me matando. Eu tentei ser outra pessoa, mas nada parecia mudar, eu sei agora, este sou eu mesmo por dentro. Finalmente me achei, estava procurando por uma chance, mas sei agora quem eu realmente sou. Venha, acabe comigo. Me enterre.”
Nada disso, pura mentira, qualquer coisa que se diga, qualquer coisa que saia da minha mente não passa de puros impulsos de energia desperdiçada com coisas ainda mais desnecessárias. E é justamente isso que move a vida, aquilo que não tem necessidade, materiais supérfluos que fazemos tanta questão de ter, de usar. E quando usamos algo que não é material? Sabemos as conseqüências terríveis que podem suceder certas atitudes e mesmo assim adentramos nesse caminho sem volta onde o único destino é a dor. Usamos de modo exacerbado tudo que nos convém, tudo que fazemos questão de usufruir pra tapar um buraco de vaidade por dentro. Na verdade, nunca se pode esconder o Sol com uma peneira; mesmo assim continuamos a acreditar em tudo que não nos dizem, tudo em que nos pressionam a fazer mesmo contra a vontade, tudo que um dia podíamos ter pensado correto, cai por terra quando a vontade de agradar ao próximo é mais forte que a razão própria.
E continua-se a crescer nesses momentos em que o erro é visível por ser mais forte que qualquer outra cor que esteja estampando o cenário do crime. Eu cresço em toda hora, é verdade. Talvez esse tipo de coisa não esteja muito ligada a minha pessoa por eu ser assim, esquisito, por eu ter pensamentos velhos, por eu ser antiquado a tal ponto de que pessoas da minha idade não entendam aquilo que quero dizer. A maior sinceridade fica exposta quando eu digo que sou complexo por natureza, que não tenho a mínima noção de qualquer coisa que esteja acontecendo só por não querer mesmo saber, pra querer evitar qualquer tipo de sentimento. A probabilidade de alegria é proporcional à de tristeza. Quem não joga não perde. Quem não joga não ganha. Brinco só se for pra ganhar.
Por isso mesmo que quem está em volta, quem circunda o palco, quem atua como coadjuvante nas cenas improvisadas que eu dirijo, sempre acaba perdendo, sempre se surpreende com algo que já era esperado, com a licença da contrariedade. Toda essa contradição me deixa bobo pois é simples, e todos estão cegos. Não enxergam tudo que eu mostro a cada segundo, não entendem as piadas, não prestam atenção numa aula qualquer que esteja acontecendo naquele momento, perdem-se desorientados por querer saber mais do que a cabeça pode conseguir. Tolos.
E estou muito novo pra morrer. Estou muito novo pra agüentar todo tipo de calúnia desmedida, mentiras insinceras, tristezas desnecessárias, fofocas particulares, bobeiras que me atingem sem dó nem piedade no incrível circo de exageros que eu mesmo formo em minha volta só pra poder ter o que dizer quando o sentimento fica maior e resolvo explodir pra fora pra não queimar por dentro. É tudo muito triste, mas é verdade. É tudo muito complicado, mas tentarão entender. Por mais que não entendam, o que importa é a minha cabeça. E a confusão que tá aqui dentro, em um instante vai mudar pra dar lugar à ordem de sempre, ao rumo certo das coisas que não estão mais seguindo o caminho certo.
Cavando a própria cova, não posso nem tenho tempo pra fazer outras coisas mais importantes. Imagine que a vida corre e continua correndo, a maior certeza que tenho dessa vida é a morte. Depois dela, nada há. Se eu passar minha estadia por esse mundo, cavando o próprio buraco onde vou descansar quando nada mais houver, será um desperdício imenso tanto por aqui quanto por lá. Por isso mesmo que a intenção é deixar tudo rolar e que alguém faça esse trabalho por mim. Têm ótimas funerárias que tratam muito bem dessa parte indesejada enquanto aproveitamos a vida de outras maneiras. Por um preço justo, estamos segurados em relação à morte. E que, quem saiba fazê-lo, enterre-me do jeito que preferir.
P.V. 17:18 03/11/08