terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Macunaíma X Peri

Algum homem sem pretensões quaisquer rabiscou um papel um dia desses e resolveu criar um herói sem caráter. Mas minha curiosidade é grande a ponto de querer entender tudo isso, de ir a fundo no papel do índio estranho que apaixona todas as mulheres que o cercam, o mito da violência e esse tipo de brincadeira estranha que dá prazer, e essa mística de mágica e sobrenatural que vem de dentro da floresta, a ganãncia por trocados, a pura e clara visão do que é ser brasileiro, malandragem sem limite de uma forma que ainda não absorvi, e seria tão bom se absorvesse logo...
Mas dos índios que leio, desde Ubirajara, Iracema, esse tal de Macunaíma, nada há de se comparar ao que me proporcionou Peri, do alto de sua forma física, da sua força animal, sobre-animal, do modo que brinca de matar onças na selva, a mesma onça que fez esse tal de Macunaíma tremer de medo e fechar os olhos ao ouvir seu gemido para não querer enxergar ser devorado; tolo por ser tolo, o gemido era de uma índia putinha qualquer. Peri o ensinaria a ser homem, o doutrinaria na santa arte da guerra, lhe diria palavras duras e lhe daria tapas na cara, lhe emprestaria sua roupa preta, ou seu arco preto, que seja. Peri lhe mostraria os caminhos a seguir e esses caminhos seriam, com certeza, os mais difíceis, pois índio rei de guerra de verdade não anda pela mata, Peri voava pelos galhos mais delicados das árvores mais podres. Peri o mostraria quão bela é a morte do inimigo, quão doce é o seu sangue derramado, Peri o ensinaria os gritos de vitória jamais cantados dessa forma assim tão despojada e cheia de ódio ou felicidade. Mas Peri o ensinaria também a amar, da forma que ele amou Ceci, sua deusa, princesa, dona de circo, que seja, mais linda do baile ou da favela ou da floresta, portuguesinha arretada de olhos da cor do céu, pele da cor das nuvens, cabelo da cor do Sol, Vei, a Sol, como diria o cara que resolveu escrever sobre o índio sem caráter, merdinha Macunaíma, que jamais chegará aos pés de Peri, guerreiro invencível na guerra e no sentimento.
Pois Peri tem para si os louros da vitória, tem na cabeça todos os planos para ser feliz ao lado de quem ama, e tem também todas as formas de vencer o inimigo salvando sua donzela e me atreveria até mesmo a dizer que Peri bolou toda aquela avalanche de águas e troncos retorcidos que desceu a floresta acabando com tudo pelo seu caminho somente para viver na eternidade na copa da mais alta árvore ao lado de Ceci no fim do livro, fim sugestivo, digam lá os críticos.
Macunaíma se importa mais em querer saciar seu prazer ao lado da índia que estiver mais perto de si, não se importa com idade, tamanhos, cores, belezas, parentesco, sua essência maior diz-lhe para não se arriscar no perigo e ir fundo na intenção de magoar os alheios.
Peri lhe ensinaria a ser homem. Mas não a ser homem branco, pois homem branco não é homem de verdade, homem branco usa arma de fogo para matar o inimigo. Peri usava o próprio corpo envenenado para combater na guerra, Peri dava conta de um exército inteiro em favor do amor que sentia por Ceci, bobinha desde sempre, virginal piranhinha fugida de Portugal quando o afetado Napoleão resolveu pular corda no quintal de seu castelo, qualquer coisa parecida, mas o fim mesmo é de que ela vive lá naquela casa dentro da floresta, cercada de paz e passarinhos que cantam aos seus ouvidos, mas Peri não entende nada disso, a inocência do guerreiro só se revela quando ele ama de verdade, e isso acontece só uma vez na vida, nem que seja preciso morrer após o fim do amor pra que não se ame de novo. Peri o ensinaria a ser homem de verdade...
Macunaíma e seus pudores, indiozinho escroto...
P.V. 23:23 10/02/11

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