sexta-feira, 13 de agosto de 2010

A máquina do tempo

E ficou essa dúvida na minha cabeça, se quando eu levantei e olhei o Sol entrando pela janela do nosso quarto, atravessando sem dó a cortina rosa ou roxa, estava numa casa, dessas que sempre sonhei, com grande quintal, piscina e muita grama pra eu cair bêbado nos dias de festas entre os amigos do meu e do seu trabalho, ou se era lá pelo oitavo ou décimo segundo andar de um apartamento da Tijuca, ou da Barra, lugares que eu também sempre tive registrados nos meus sonhos mais bobos e gays, conjeturando possibilidades de vida eterna e feliz ao lado de quem se ama.
Mas então, o fato foi que devia ser o meu dia de colocar o lixo pra fora, porém os mais de 20 anos dormindo numa cama muito dura me fizeram viciar nesse colchão maravilhoso de molas e passei do limite dos acordes do despertador e lá se foi o caminhão da Comlurb.
Seu estresse é conhecido desde aquele distante 25 de abril quando pediu minha mão em namoro, meu amor, mas nunca pensei que pudesse ficar com tanta raiva e tanto ódio no coração se por um diazinho de nada eu tivesse esquecido de colocar o lixo pra fora... ora, amanhã ou depois, o caminhão há de passar de novo, e será sua vez de colocar pra fora, o que nos dá a segurança de que, de fato, ele estará lá, longe dos domínios da residência. Aliás, seria sim uma boa idéia se você cumprisse essa missão sempre... Não? Tudo bem... não precisa gritar.
A minha total sorte é que sei de todas as formas de arrancar sorrisos do seu rosto que está cada dia mais lindo, cada dia mais apaixonante, cada dia me chama mais para lhe beijar como nos primeiros dias de amor... olha aí... já está sorrindo... Pode deixar que eu não vou mais esquecer de colocar o lixo pra fora.
E são essas promessas que eu faço todos os dias que eu tenho certeza que não terei capacidade alguma de cumprir, ainda que eu me esforce de maneira enorme, ainda que eu madrugue, que eu acorde antes dos senhores do lixo, que eu esteja de pé no portão abraçado com o lixo desejando a todo instante que o caminhão vire a esquina e venha pegar o que lhe pertence.
Promessas como amor eterno e essas outras coisas são bem mais fáceis de cumprir. Agora não me venha com pedidos de lixo, nem de remédios estranhos, nem chás com plantas ordinárias que isso não cola nem funciona comigo.
Foi um pouco mais ou um pouco menos do que eu sempre sonhei e aí, num dia desses, num momento estranho que já vai se fazendo comum aos meus olhos devido à sequência com que acontece, que eu parei pra pensar e lembrar de tudo que já aconteceu e dos erros, dos medos, e de como éramos infantis e pequenos dentro de nosso próprio tamanho, relacionei todo o sentimento que costumávamos dizer um ao outro, como se já fosse decorado, como se fosse tão certo que nada mais abalaria o que a gente sentia, e ao mesmo tempo era um pavor tão grande de que tudo fosse pelo ralo abaixo como água suja que procura mais água suja e me arrependo de tudo isso...
Uma puta perda de tempo...
Hoje, cada dia da semana, de segunda a domingo, abro os olhos pela manhã e a primeira coisa que vejo são suas grandes bochechas rosadas, seus olhos fechados, o meu eterno anjo sem asas dormindo como um bebê e nada do que digam, ou do que disseram, ou que tenha um dia acontecido pode ser maior ou mais importante do que isso pra mim, não preciso lhe dizer nada, você não precisa entender nada, minha princesa, posso te olhar mais uma vez antes de levantar, posso, vez ou outra, trazer-lhe o café na cama, uns dias com coração desenhado com ketchup, outros dias com mais um copo de suco de melancia só pra ouvir dizer que não gosta, e gosto tanto de lhe ouvir dizer que não gosta, só pra eu beber olhando pra você... ou posso lhe deixar lá dormindo, tomar meu banho sem fazer barulho, me vestir, me arrumar, escrever alguma coisa num papel velho e deixar em cima da cama, em cima do meu travesseiro, pra você saber que ainda te amo, pra você sorrir mais uma vez quando acorda, só porque eu sei todas as formas de arrancar sorrisos do seu rosto.
Devia estar me sentindo como um bobo, deveria querer que o dia corresse de forma rápida pra que eu voltasse logo pra casa e te encontrasse lá me esperando, quem sabe cansada do seu trabalho, quem sabe com alguma surpresa preparada pra mim, ou um jantar especial, pois só agora depois quatro anos casados vai aprendendo a cozinhar um pouco melhor... mas me deixo estar, aprendi que a saudade é necessária, que faz parte da vida do casal, ninguém está predestinado a enjoar de ninguém, nem é obrigado a querer olhar pra cara do outro durante o resto da eternidade, porém existe o esforço pra que seja tudo melhor do que pode ser. Relações perfeitas não existem. Mas a gente tenta chegar perto disso até que as coisas lá que o padre falou aconteçam...
Mas então... vou deixar o futuro acontecer e depois quem quiser que diga se eu não tinha razão.
P.V. 11:04 13/08/10

Um comentário:

Karoline disse...

nunca tive o hábito de por o lixo p. fora .. no entanto, fico extremamente irritada quando não colocam . rs
váa se acostumando ... s2